segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O tempo passa devagar

31 de Agosto de 2009, 2ª Feira. Nova viagem à porta. Antes de cada viagem começo a ser invadido por uma ansiedade enorme, cada dia passa mais devagar. O tempo é agora mais denso. Após dois anos aqui, começo a atingir o ponto de ruptura. O isolamento está a fazer efeito. Veremos a ida a casa dá para carregar as baterias. A “hivernage” está a ser boa este ano. As culturas serão boas. O gado engordou. Os sorrisos voltaram às caras desta gente. Estamos em pleno Ramadão, mês sagrado para os muçulmanos. Estou a dar aulas de “apanha de gafanhotos” à Tavinha. Ela adora gafanhotos. Eu adoro que ela adore gafanhotos. Porque os ditos, adoram a minha horta. Então para que tudo fique mais adorável, nada melhor que ela caçar a sua própria comida. Ganha independência, fica com a barriguinha cheia e eu todo contente. O nosso refeitório vai de mal a pior. Dois anos a comer mal, com reclamações diárias começa a incomodar. Chegamos a um ponto em que deixamos de acreditar em promessas. A vantagem de uma situação chegar a um nível paupérrimo é que pior não pode ser. Assim vai a nossa cantina. O problema é que não há meio de melhorar…

sábado, 29 de agosto de 2009

A Solidão

A solidão é insuportável no meio da multidão
O silêncio é recortado pelas notas de música

O vermelho do chão trocado pelo verde da vegetação
A poeira omnipresente substituída pela lama
A secura dum olhar à procura da chama

O rio nestes dias vira mar
O peixe cai do chão
O calor finalmente dá-se a respirar
A vida salta de mão em mão

Efémeros dias suados
Momentos de sobressaltos
Histórias aos bocados
Fados trasladados
Corpos bronzeados

A solidão é insuportável no meio da multidão
O silêncio é recortado pelas notas de música
A biologia escapa às leis da física
Os pés fogem pelo chão
A luz agarra objectos difusos
O amor inventa novos fusos

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Filho

Os olhos ficam baços
Lágrimas saltitam sem parar
Novelam-se os traços
Dá um nó ao falar

Tantos que couberem
O hábito não apaga o coração
Tantos que vierem
Serão sempre primeira edição

A honra que cabe ao primeiro
É de estrear emoções
Por mais estreito que seja o carreiro
Mesmo o último traz aflições

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Silences

I’m a shepherd of silences
Silences are real music to my hears
Make me jump on fences
And make my eyes drop some tears

I’m in love with transparencies
Transparencies are real colors to my eyes
Make me cry latencies
And make me fill my lungs tight

I’m a sun for the trees
Trees are best symptom of wealth
Make me search for bees
And make me lay without breath

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Visita ao Outro Lado

O novo colega chegara à pouco. Ainda não se ambientara. O Mais Velho ligou-me. Se podiam vir passar o fim-de-semana. Claro. Já está tudo preparado para vos receber. Vieram. O jantar fumegante, apetitoso, chamava todos. Contaram-se histórias. Quase todas engraçadas. Como acontece nestas ocasiões, o álcool baixa fácil. Ficamos todos mais ouvintes. As palavras saiem fáceis. O encontro de amigos é sempre um ponto alto. No dia seguinte fomos ao Outro Lado. O Mais Velho não trazia passaporte. “Não é necessário” disse-lhe. Lá foi mas duvidando do que lhe dissera. Pois se aquela era uma das fronteiras “difíceis”. Quando o apresentei como o Mais Velho, meu grande amigo, teve tratamento VIP. Ninguém pediu documentos. Já no Outro Lado igual modo de receber amigos. Dirigimo-nos ao “Maria Joana” sempre em animada discussão. Quando o novo colega e o Mais Velho receberam as suas louras, pondo termo a uma secura já de idade razoável, beberam o primeiro golo e fizeram o primeiro “AHHHHHH”, percebemos todos, que valera a pena. Mais bazucas se seguiram. A conversa seguia animada. Surgiu então o “Homem Esqueleto”. Sempre que fui ao “Maria Joana” vi lá o dito. Sempre me pareceu que fazia parte da mobília. Por várias vezes o vi ler as pedras a clientes da casa. Desta vez estava longe de idealizar os bons momentos, que nos iria proporcionar. Começou a ler as pedras ao Mais Velho. Ninguém estava a contar com o que veio depois. O Mais Velho pediu as pedras ao Homem Esqueleto e lançou-as. E depois começou a falar, como se toda a vida tivesse feito isso. O Homem Esqueleto, mexeu-se no banco. Primeiro inquieto. Depois começou a sorrir. Um após outro. Todos os clientes se chegaram. Todos queriam ver o Toubab que sabia ler as pedras. Que leu as pedras ao Intocável Homem Esqueleto. E que este com um sorriso mais amarelo que normalmente, confirmou tudo o que o Toubab dissera. A Magrinha, empregada da casa, foi a primeira. A cada revelação do Mais Velho, seguia-se um “AH” de aprovação. A determinada altura, o Mais Velho parou e disse “A partir daqui só a pagar” e mais não revelou à prestável Magrinha. Todos os clientes da casa rodeavam já a nossa mesa e todos queriam saber o que a vida lhes reservava. Um deles em particular, o Sr. Ilustre, pessoa desconhecida por nós, forasteiro concerteza, pediu para o Mais Velho lhe revelar o que se iria passar essa tarde. O Mais Velho olhou-o de alto a baixo e de baixo a cima. Lançou as pedras e dirigiu-se àquele forasteiro bem vestido, “Esta tarde vai ser a mais importante da tua vida nos anos vindouros”. O forasteiro retrucou “Que mais me dizes?” Nova mirada às pedras e lá veio “Vais fazer um negócio de muito valor” “E como vai correr?” “A partir de agora só a pagar” toda a gente ficou intrigada, quem seria o Mais Velho? Como era possível um Toubab saber ler as pedras que apenas o Homem Esqueleto sabia interpretar? As loiras desciam velozmente. Ainda hoje mais de um ano após esta visita a Magrinha me pergunta pelo meu amigo. Que nunca ali entrou um Tuga tão simpático. “E sabia ler as pedras!”.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Dois Anos

18 De Agosto de 2007
6:00 am – Tocou o despertador. Acordei para um dia completamente inesperado apenas duas semanas antes. O dia da minha viagem para a Mauritânia. Foi o dia em que mais me custou levantar e despachar em muitos anos. A Guida fez-me dar um beijo ao Xavier, coitado estava de tal modo a dormir que não deu qualquer sinal, quando o agarrei para o beijar. A Inês, como sempre aparenta maior autocontrolo e deseja-me boa viagem.
18 de Agosto de 2009, 3ª Feira. Faz hoje dois anos. Que vim para a Mauritânia. Cinco por cento da minha vida. As voltas que o mundo já deu desde que aqui cheguei. Vi o petróleo bater todos os recordes de preços. Assisti a um golpe de estado. Vi o petróleo cair a pique, a gasolina em Portugal nem por isso… Vi os cereais atingirem preços proibidos. Vi o PS perder as eleições europeias. Andei de camelo. Acompanhei a eleição do Obama, com toda a expectativa que isso trouxe a todo o mundo. A minha perspectiva do mundo deixou de ser apenas centrada em Portugal. Acompanhei o desenvolvimento da crise, que ao contrário do que possa parecer, não é exclusiva de Portugal. Vi nascer o sol quase todos os dias. Atravessei o rio Senegal a nado. Atravessei fronteiras dezenas de vezes. Encontrei novos amigos. Observei sociedades muito diversas da nossa. Percebi que a Europa já não interessa muito a quem lá não vive. Vi o Sporting ganhar uma Super taça e uma Taça de Portugal (ambas ao FCP). Vi o mesmo FCP ganhar dois campeonatos. O Nelson Évora ser campeão olímpico, e hoje vice-campeão do mundo. Assisti àquilo que já foi descrito como o fim da “Mauritânia Amável para o turista ocidental”. Vi amigos serem evacuados deste país, devido a atentados bombistas. Não vi o Rally Lisboa – Dakar, em Janeiro de 2008, deviam ter sido realizadas três etapas aqui perto, que eu, claro contava ir ver, mas não houve. Aniversariei duas vezes aqui. Tenho um cão. Que atingido o estado adulto, não me liga nenhuma, só quer é gajas. De vez em quando aparece a pedir desculpa, mas isso dura uns cinco minutos… Tenho uma macaca, que só quer fazer macaquices, cujo petisco preferido dá pelo apetitoso nome de “gafanhoto”, tenho que ser eu a apanhá-los, que a menina é fina… Perdi um amigo e colega de profissão. Ontem revi todo o filme, com o acidente de outro amigo e colega, felizmente sem consequências de maior. Já vou na terceira estação das chuvas nesta terra. Vi inundações, que fariam corar de vergonha os nossos jornalistas, quando anunciam inundações em Portugal. Assisti a chuvadas como só tinha imaginado, quando amigos e familiares, contavam como era na antiga África Portuguesa. Já engoli mais pó nestes dois anos que em toda a minha vida. Vi tempestades de areia, que pareciam produção de Hollywood. Fiz excursões de piroga ao longo do rio Senegal. Fui a Espanha, a França, a Gibraltar e a Ceuta (África) com a minha prole. Já tenho umas dezenas de carimbos no passaporte. Fiz milhares de quilómetros em picadas. Percebi que por mais crises que hajam em Portugal, continuamos muito longe de estar na miséria. Fui picado por centenas de mosquitos (sacanas, devem ter morrido envenenados). Fiz MUITAS vezes cem quilómetros de jipe, em picada, mais piroga, mais quilómetros a pé, só para saborear uma loura fresquinha. Mudei durante este tempo, fruto da solidão, da distância, do ar, da paisagem, do cheiro, dos novos amigos, deste continente. Sei o que é o anti-stress. O depois. O amanhã. O está quase. O é difícil. O relógio quase, quase, parado. Vi ONG’s. Acompanhei de perto programas da ONU. Comecei a escrever. Até poemas. Tenho uma horta. Sei o que é viver com um calendário de outra religião. Vim para um sítio onde me pediam que fale francês e o meu inglês está cada vez melhor. Cada vez que vou a casa sinto um frio de morrer. As distâncias aqui têm uma dimensão nova, que transformou Portugal em algo “pequenino”. Carros que em Portugal durariam uma vida, aqui com um ano estão “maduros”. Vi tudo isto. Vi muito mais. A magia é por um lado “ver” por outro é “apreender” e “sentir”. Não sei o que o futuro trará. Talvez porque como alguém disse o futuro nunca existe, o que existe é sempre o presente. Só sei que a capacidade de maravilhamento está cá. O ficar apaixonado por uma flor. O sentir a natureza despertar após oito meses de seca. O ver peixes a sair do chão após a queda das primeiras águas. O vermelho da areia, transformado em verde da erva em escassas horas. Isso ninguém mo pode tirar.

sábado, 15 de agosto de 2009

Também chove no Deserto

Chuva vista da nossa porta de entrada, as nossas bananaeiras estão a ficar bonitas. Foi "isto" que me fez passar uma noite na estrada, no Senegal, a dez quilometros de Bakel.

Aspecto do Radier pk28, em Samba Kanji. O nivel da água sobe dois metros acima do dito.

Radier pk10, em Mamaéli, aqui a água só sobe 1,5m...



Ponte junto ao Lycée em Sélibaby.




Pequenas amostras do que uns minutos de chuva podem fazer.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Parabens Pa Ti e Pa Mim

Dezassete

Nevoeiro na Serra
Na lezíria estio abafado
Acontecimento na terra
Leves fatos de gala
Jovens sorridentes
Flores na sala
Dia inolvidável
Sardinha assada
Todos com ar saudável
Família em coro
Cantou-se o fado
Bailou-se com decoro
Dia assim não voltou
Conta o que sentes
Quem assim amou
Tantas agruras passadas
Alegria infindável
Situações delicadas

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Tudo bem, ou nem por isso.

10 de Agosto de 2009, segunda-feira. Hoje foi um dia marcante para mim. Por um lado estou contente porque o trabalho correu bem. A terraplanagem está em bom ritmo. O betão anda bem. Está tudo em velocidade de cruzeiro. Não é pelo que fazemos agora que a obra está atrasada. Devido às grandes chuvadas do dia 30 de Julho, alguns problemas ficaram expostos. Com a chegada do Sr. Niang, praticamente tudo ficou esclarecido. Aceitou quase todas as nossas propostas. Significa que eram boas… Vi hoje um espectáculo impressionante. A transumância em todo o seu esplendor. Regressaram a Gouraye cerca de 500 vacas. O que tem isso de especial? Apenas o facto de terem que atravessar o rio Senegal. A nado. Com alguns homens a nadar lado a lado com o gado. Também alguns barcos ladeavam o conjunto. Só visto. Segundo me informaram, todos os anos gado mauritano é deslocado para o Senegal e Mali na época da seca, regressando durante a chuva. Este dia fica também marcado pela notícia que o Peace Corps vai encerrar as suas actividades na Mauritânia. Se este facto poderia ser antecipado, pelo facto de não haver novos voluntários este ano. Pelo problema dos vistos para os cidadãos norte-americanos. Pelo assassinato de um americano em Nouakchott, durante o mês de Julho. Pelo acto eleitoral aqui vivido também no mês passado. A gota de água terá sido o atentado suicida frente à embaixada francesa na capital mauritana. Foi com surpresa que soube, pelos meus amigos da sua evacuação para Dakar. Senti aquilo que sentiu um grupo de jovens que abandona tudo, para vir para uma terra distante, em condições bastante difíceis, que é confrontado com uma situação para a qual em nada contribuíram, mas que serão eles a sofrer as consequências. Tinham ainda um ano pela frente e aparentemente de forma abrupta, terminaram aqui a sua estadia. Também eu deixo de poder conviver com um grupo que me ia ajudando na minha estada. Bem-haja, Shelby, Emily, Tim, Tabatha, Sari e John. Vamos ver o que isto vai dar.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Verde e água

6 de Agosto de 2009, quinta-feira. A metamorfose sofrida por esta terra nos últimos dias foi qualquer coisa que mesmo para um “veterano” impressiona. Vêem-se campos pintados de verde, em vários tons, desde o claro-quase-amarelo da erva recém cortada, ao verde-turquesa e mesmo o verde-oceano de pastos a perder de vista. Juntam-se nesta sinfonia verde as árvores, cada qual com o seu verde. Não deixa de ser curioso numa terra situada na entrada do deserto poder apreciar tantos verdes como não sabíamos existir. Este êxtase verde vai ainda durar até perto do final de Setembro. Por essa altura toda a paisagem repentinamente altera a cor, como se tudo fosse combinado. O outro factor aparentemente fora de contexto nesta paisagem é a presença de água. Existe tanta e por todo o lado. Os sinais de sua presença extravasam no entanto os locais onde ela resta tranquila, pois a forte chuva que caiu nos últimos dias deixou marcas. Vedações derrubadas, postes de telefones caídos, estradas rasgadas como se foram papel. Estivemos isolados da Mauritânia entre quinta-feira e terça-feira, altura em que Garfa mostrou quão impressionante pode ser, não deixando ninguém passar. É por estes dias que os nómadas deixam o Guidimaka e voltam às suas terras, não sei se é mais impressionante ver no séc. XXI, pessoas partirem de burro e camelo com toda a tralha às costas, ou ver a quantidade de animais que “fazem parte da família”. Hoje vi-me no meio de uma manada de vacas com uns milhares de cabeças, parecia que estava no faroeste, num filme de cowboys.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

É tão doce, a vida

É tão doce, a vida
Existe lá algo mais doce que um chocolate?
Mais doce que uma ginginha?
Mais doce que uma fatia parida?

É tão verde, a vida
Existe lá algo mais verde que um prado?
Mais verde que um jardim?
Mais verde que a esperança sentida?

É tão bela, a vida
Existe lá algo mais belo que uma criança?
Mais belo que o mar?
Mais belo que uma tela colorida?

A vida acorrenta e liberta
É quente e fria
Deixa sempre uma porta aberta
É noite e é dia

É amor e desamor
É tudo e é nada
É espinho e é flor
É bruxa e é fada

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Aqui estou eu

Aqui estou eu, absolutamente perdido
Espero por um sinal teu
Um olhar, um pestanejar, um sorriso fingido
Para desespero meu

Aqui estou eu, a nadar no deserto
Isolado de tudo
Tudo, tão longe e tão perto
Cada vez mais sisudo

Aqui estou eu, só com minha alma
Escutando todas as cores do mundo
Por mais que mantenha a calma
O meu espírito voa cada vez mais fundo

Aqui estou eu, na companhia das minhas memórias
Ouvindo músicas maravilhosas
Recordando todas aquelas histórias
Especialmente as perigosas

Aqui estou eu, congelando neste calor
Cansado de nada fazer
O coração bate com ardor
A cabeça a doer

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Liberdade

3 de Agosto de 2009, segunda-feira. E se afinal a vida terrena for tudo o que há. Se quando fecharmos os olhos pela última vez, for mesmo de vez. Se não existir o Éden. Se for esta a vida que temos para viver. Se esta existência for O TUDO. Imaginemos que assim seja. Quantos de nós viveriam a vida que vivem, se fossem sabedores desta verdade? Quantos de nós seriam mais egoístas? Quantos de nós aceitariam os dogmas, que tantos nos impingem? Por outro lado, quantos saboreariam a vida com todos os sentidos alerta, aproveitando o que há para aproveitar? Não sei se a vida seria mais ou menos suportável. Se seria mais agradável. Se seria intragável. Sei que seria vivida com verdade. Cada um sabendo que ISTO é o que há. Não vale a pena esperar por recompensas, perdões, comendas ou ilusões. Se cada um tivesse consciência que este é o nosso paraíso, provavelmente não desperdiçaria energias ouvindo discursos teleguiados, que apenas nos condicionam. Que apenas pretendem controlar o rebanho. Por mais que berrem, que nos queiram iludir, não deixarei de ser livre. Ser livre implica poder escolher o caminho. Mesmo que seja o pior. Dessa liberdade não abdico.

domingo, 2 de agosto de 2009

Vida

A questão que nos todos nos colocamos
Que gostaríamos de ver esclarecida
A resposta que todos ansiamos
Qual é o sentido da vida?

Nas horas de dor
Quando há uma amigo de partida
As dúvidas assaltam-nos com fragor
Qual é o sentido da vida?

Quando um choque nos desperta
Para a realidade sofrida
Olhamos a estrada deserta
Qual é o sentido da vida?

Não há longe nem distância
Nem porta de saída
Quando perguntamos com ânsia
Qual é o sentido da vida?

Alegrias, amarguras, amores, desamores
Sensações de fugida
Pedreiros, engenheiros ou doutores
Qual é o sentido da vida?

Será que se fizermos ao menos um amigo
Daqueles do coração
Como um vulcão em erupção!
Fará a vida sentido?

Regresso

2 de Agosto de 2009, domingo. De regresso à Mauritânia e à escrita. Muito se passou desde a última vez que me sentei frente ao meu PC. Voltei a casa, numa altura em que desesperadamente precisava. Felizmente por lá está tudo bem. Cheguei a África na quinta-feira, quando desabou o céu sobre o Guidimaka. Em Selibaby foram 120 mm. A dez quilómetros de Bakel, fiquei retido por cerca de 12 horas. Apenas às 7 da manhã de sexta-feira foi possível atravessar. Se em Julho de 2008, quando regressei de Portugal, tal como agora, uma ponte e uma passagem hidráulica caíram, devido a uma chuvada equivalente a esta e quanto a isso não haverá muito a dizer, pois a quantidade de água é incomensurável e não é fácil conciliar orçamentos de doadores com verdadeiras necessidades no terreno. Não posso conceber que se deixe uma cidade como Bakel completamente isolada do resto do país por um ano inteiro. E isto num dos países onde alguma coisa ainda funciona… Para chegar a Selibaby foi uma aventura, com final feliz. A chuva veio-nos mostrar algumas (poucas) deficiências do nosso projecto, que com um pouco de engenho serão corrigidas e poderemos orgulhar-nos do que iremos aqui deixar. Se os humanos me receberam bem, a grande recepção que me foi dada, foi a do Xapi. Foi impressionante! Não sabia dele. Assobiei. De repente vindo não sei de onde, apareceu ele, enorme. Elegante. Já não é o cachorro que eu conhecia. Agora é um animal adulto, no auge das suas faculdades. No entanto veio ao meu encontro, saltou, como querendo saltar-me para o colo. Chorando, como uma pessoa que abandonámos, que no reencontro tudo perdoou mas… não esqueceu. Fez questão de me demonstrar isso mesmo. A estadia aqui é penosa. Só penso em ir embora. Os acontecimentos do mês passado entraram de rompante na minha vida, sem pedir licença. Fui completamente atropelado. Estou quase a completar dois anos aqui. Até hoje nunca me custou tanto estar nesta terra esquecida como agora. O que vale é que regresso a casa no inicio de Setembro. Mas reparei que tenho uma sombra nos olhos que não irá desaparecer facilmente.

Tem os que passam

Tem os que passam, de Alice Ruiz "Tem os que passam e tudo se passa com passos já passados tem os que partem da pedra ao vidro deixam t...