segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Filosofias...

26 de Outubro de 2009, segunda-feira. Em jeito de balanço, parcial é um facto visto que a minha estadia nestas terras do fim do mundo não terminou, poderei afirmar que quando cheguei comecei a cultivar couves, rabanetes, tomates e cebolas, para vinte e seis meses depois achar no meu “jardin” papaias, bananas, quiabos, beringelas e bissap. Cheguei vindo da “civilizada” Europa, para passado todo este tempo concluir que ninguém quer saber da Europa, que esta está numa crise sem solução aparente, porquanto é uma crise geral, de valores, de paradigma, política, de estagnação económica. É uma crise burguesa, de barriga cheia, onde o individual venceu o colectivo. É uma crise conduzida por um ror de vitórias sem fim. A Europa conseguiu convencer (quase) todo o mundo que na Europa é que é bom, que o sistema económico (burguês) europeu é o melhor. Quase todos os países do mundo aderiram ao sistema político (democracia) europeu. As multinacionais europeias estão presentes em todo o mundo, a um nível superior ao período colonial. Nunca se viveu tanto, nem tão confortavelmente, nem com tanto retorno económico como agora. O que se passa então com a Europa? É um clube de ricos (anafados) fechado! Abanamos as nossas jóias para todo mundo ver (não pode tocar). Direito de admissão reservado. O paradigma económico baseado no crescimento esbarra na finitude do planeta, das matérias-primas. Basicamente poderemos dizer que pode haver muito para alguns mas não pode haver muito para todos. Estamos então muito preocupados com as nossas casas, com as nossas reformas, com o nosso estatuto de consumidores. Num mundo cada vez mais global, quem tem medo de perder o lugar, vai perdê-lo certamente. Interna e externamente. O centro de decisão partiu. Não voltará tão cedo. Não voltará enquanto a miopia e a estreiteza dominarem os espíritos dos descendentes dos Grandes que prevaleceram em idos históricos.

domingo, 25 de outubro de 2009

Alterações Climáticas

25 de Outubro de 2009, domingo. Vim para um país desértico. A chuva era tal raridade, que nos idos de 80 a esmagadora maioria das pessoas assentou arraiais. Transformou pequenos aglomerados sem estruturas em enormes ajuntamentos completamente impreparados para acolher quem quer que seja. Ao assentamento sobreveio um crescimento populacional galopante, com a duplicação de almas a cada vinte e cinco anos. Existem muitas variáveis presentes na aventura humana. Uma das que mais influência exerce sobre todos nós responde pelo nome de fortuna. Ora estas gentes sobrevivendo numa região árida, quase no limite do habitável, sem se aperceber vai assistindo ano após ano ao aumento da época chuvosa. Esta estação foi incrível sobre todos os aspectos. Tudo correu bem. Pensar que no inicio da época húmida as pessoas foram para as mesquitas pedir chuva ao Todo-Poderoso. Já passaram cinco meses e meio desde as primeiras gotas. Daqui a uns anos ainda vamos testemunhar o desenvolvimento florestal. Benditas alterações climáticas. Quais Quioto quais quê!

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Renascimento

20 de Outubro de 2009, terça-feira. Renascimento! O dia 19 de Outubro de 09 vai ficar registado como o dia do meu renascimento. Ontem cerca das 7 e meia da manhã, dirigia-me eu, mais o Rafa, para Garfa, quando tudo sucedeu. O que se segue durou cerca de um segundo. Poderei dizer que se tratou de um segundo interminável. Já muitas vezes ouvira dizer que em determinadas situações, a vida, nos passa toda pela frente, em poucos momentos. Pude confirmar que tal facto infirmei. Dizia então que me dirigia a Garfa, ao chegar ao cimo de uma lomba da “estrada” deparo-me com um “monstro” branco, que velozmente se dirigia contra mim. O tal monstro era um Toyota Land Cruiser, transportava onze pessoas no seu interior mais cinco no tejadilho. Bem como toda a bagagem desses viajantes. Eu encontrava-me na minha mão, o problema era que o monstro também… A minha cara, não sei como aparentava embora imagine, a do condutor do monstro era de puro terror. As dos passageiros do tejadilho essas então eram de meter medo. Consegui observar todos os pormenores do monstro. Lembrei-me dos meus filhos em Portugal e de como estava iminente um fim inglório para a minha estada aqui. Vi perfeitamente o acidente que ocorreu. Vi os meus avós a olhar para mim. Percorri os factos ocorridos nestes últimos anos e que me trouxeram aqui. Vi-me ainda pequeno a brincar em casa dos meus pais. Vi a grelha do monstro a rir-se de mim. Um branco que encheu todo o campo visível. Senti cada músculo do Rafa a comprimir-se. Pensei, “Então é assim que tudo acaba”. De repente o monstro ataca os últimos metros em duas rodas, inclina-se para a esquerda, duma forma que só podia tombar. De repente o tempo estica-se e tenho o carro parado, estamos inteiros. Estou cansado. Custa-me a respirar. Olho para trás e vejo o monstro a voltar à verticalidade. Volta às quatro rodas. Imobiliza-se também. Está a cerca de cem metros de mim. Percebi que continuo neste mundo. Tenho um nó na garganta. Falar está a revelar-se difícil. Engreno a primeira e parto para Garfa. Ouço o Rafa dizer que temos vidas como os gatos. Ouço-me a responder, que isso é bom, mas se ter vidas de reserva é bom, gastá-las não é bom…

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Incerteza

16 de Outubro de 2009, sexta-feira. Incerteza! A única coisa que temos por certo nesta vida é que um dia morreremos, de resto reina a incerteza. Uns dias mais tristes, outros mais alegres. Umas situações agradáveis, outras aborrecidas. Casos em que fazemos o que queremos, outros onde engolimos sapos. Ao analisarmos o papel da incerteza na nossa vida deparamo-nos com esta situação engraçada, à incerteza devemos o interesse pela existência. Independentemente de estar tudo pré-determinado ou não, isso daria para uma grande discussão. Para cada um de nós, o futuro ainda não aconteceu. Somos nós que o fazemos, com cada uma das nossas decisões.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Bem Hajam!

12 de Outubro de 2009, segunda-feira. Um dia depois das eleições autárquicas. Muito se disse e escreveu. Quase todos ganharam (vá lá desta vez houve um que assumiu que perdeu, foi o BE, costumam todos ganhar…) Poucas alterações se verificaram. Presume-se que das duas uma, ou o pessoal está contente com o poder autárquico ou as alternativas, apenas o são no papel. Na nossa zona apenas a Câmara de Alcanena mudou e mesmo aí o presidente cessante não se recandidatou. Em Torres Novas o Rodrigues parte para o último mandato com confiança reforçada. No Entroncamento o Ramos amplia a vantagem. Na Chamusca o Carrinho parte para o último mandato depois de 30 anos no poder, sem maioria absoluta, mas já com experiência nesse domínio. Constância ganhou novo presidente sem mudar de cor, o novo é o Máximo. Na Golegã, antigo baluarte vermelho, o rosa Maltez cilindrou tudo e todos com uma goleada por 5-0. Daqui por quatro anos sim, vai valer a pena. Mais de 100 presidentes terão que deixar de o ser. Pode ser que surpresas aconteçam. Pode também ser que sem o espectro da reeleição estes autarcas embarquem num mandato mais desinibido, para deixarem um legado prós vindouros exaltarem. Veremos. Quanto à asserção por muitos analistas, que o país está sem rumo, sem líderes carismáticos, a navegar à bolina. Urge reencontrar objectivos para o futuro. É indispensável deixar de discutir pormenores e passar aos pormaiores. Estamos a discutir o sexo dos anjos há anos. Agora que pertencemos ao clube dos ricos, ficámos gordos e anafados. Precisamos de um trilho que nos faça redescobrir o orgulho em ser português. Teremos que passar urgentemente do registo do “mais auto-estrada ou menos auto-estrada”, do TGV, do novo aeroporto. Teremos que atingir um consenso sobre quantos funcionários públicos necessitamos. Teremos que passar a reconhecer o mérito como forma de distinguir os melhores. A cunha terá que ser enterrada de vez. A mesquinhez deve dar lugar aos nobres objectivos. Acima de tudo teremos que produzir mais e melhor. Finalmente devemos interiorizar que ser só consumidor não chega. Devemos exigir ser Cidadãos. Devemos utilizar moedas com duas faces. Cara e Coroa. Direitos e Deveres. Só assim poderemos ser reconhecidos como pares. O bota abaixo provém de almas pequenas. Felizmente que existe gente para quem os Velhos do Restelo, são um facto histórico, sim, mas enterrado. Gente que se bate por esse mundo fora para que se saiba a cepa de que são feitos os Portugueses. Bem hajam!

domingo, 11 de outubro de 2009

Sahel

11 de Outubro de 2009, domingo. É a escutar Sting no seu novo álbum If On A Winter’s Night, que começo a dedilhar o teclado ao mesmo tempo que as ideias começam a querer autonomia. A região onde nos encontramos pode também ser denominada Sahel. Representa a fronteira sul do grande deserto do Sahara. É uma terra difícil de se deixar dominar pelo homem. Terra de excessos. Terra que tudo dá mas exige bastante em troca. Até há pouco tempo atrás o grande deserto todos os anos reclamava extensas áreas para juntar aos milhões de quilómetros quadrados que já lhe pertencem. Se aparentemente no chamado corno de África tal ocorrência aumentou de ritmo, por aqui na África ocidental as alterações climáticas tendem a auxiliar a vida de quem aqui provém o seu sustento. De facto após um período de grande seca entre os anos 1968 e 1984 que provocaram o assentamento deste povo maioritariamente nómada, que se deslocava junto com os seus animais numa busca incessante de água e comida. Sobreveio outro progressivamente mais húmido. Tem ocorrido mais precipitação e durante mais tempo. Este facto permite o desenvolvimento das culturas e mais alimento nas mesas (na realidade quase ninguém usa mesas por aqui). Pena é que não existam estruturas de apoio à agricultura, como barragens que permitiriam o usufruto de água também durante o período de seca. Talvez devido às exigências de amante despeitada suportadas com desespero pelos locais e ainda mais desespero pelos estranhos que por aqui se aventuram, esta seja uma terra pouco povoada e muito pouco investida. Para quebrar este ciclo vicioso apenas vejo ou um golpe de sorte ou a descoberta de algum tesouro no subsolo. No entanto com alguns investimentos poderiam sair daqui alimentos para muitas pessoas que passam mal.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Hortas e Filosofias

8 de Outubro de 2009, quinta-feira. É curioso, hoje comemos bananas da nossa horta. Temos uns dez cachos nas bananeiras a crescer. As papaieiras estão carregadas de papaias. Os bissapeiros estão cheios de bissap (o bissap é a parte carnuda que envolve as sementes, tem cor vermelha e faz uma bebida refrescante muito apreciada por aqui). As beringeleiras continuam a produzir beringelas. Pepinos são colhidos cada dia. A Tavinha (também conhecida por Petit Penda) ontem viu-me curiosa a mondar a horta. Hoje arrancou uns dez pés de milho e dois pés de pimento. Os gafanhotos são bastantes e fazem estragos. A “hivernage” pertence definitivamente ao passado. Os dias voltaram a pertencer exclusivamente ao deus Sol. O mercúrio encosta de novo aos 40ºC. O omnipresente pó está de volta. Amanhã vou começar os estudos para a execução do projecto da estrada entre Gouraye e Diagili. Talvez lá para a Páscoa seja possível terminar a obra. Depois de um período complicado a nível pessoal voltei a sorrir. Porquê? Porque temos (finalmente) trabalhado bastante. Quando assim é resta menos tempo para o disparate. O pouco tempo livre tem que ser ocupado com qualidade. Nada melhor que sorrir. Agradecer poder apreciar tantos cheiros, tantos sentimentos, tantas cores. Cores, estamos numa fase em que as cores que nos envolvem variam a cada dia. O verde diminui em detrimento do prateado e do dourado. Como parecem longe os comícios e as palavras de ordem que fazem os dias em Portugal. Mais umas eleições à porta. Mais uma vez não vou poder votar. Até hoje só não votei por ausência do país. Este ano pela terceira vez não irei colocar a cruzinha no quadradinho. Não irei participar do acontecimento mais desejado por quem o não tem. Mais vilipendiado por quem a ele tem acesso. Porque será que só valorizamos o que nos é vedado? Porque será que a épocas históricas em que heróis se imolam para permitir uma existência “normal” à esmagadora maioria da população, se seguem épocas de desinteresse, de astenia generalizada. A ganância ganha terreno. A tentação da opulência torna-se generalizada, ofuscando nobres sentimentos. Tornando tudo e todos em seres acéfalos quais formigas que lutam arduamente para terem tudo o não faz falta, esquecendo os ideais dos nossos ancestrais. Todas as lutas do passado para que pudéssemos ser cidadãos e tudo o que queremos ser é consumidores!

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Terra Estranha

6 de Outubro de 2009, terça-feira. Terra estranha esta, aparentemente nada dá e tudo exige. Tal é o sacrifício a todos, exigido, para apenas aqui continuar. Mas bem analisada a situação, verificamos o enorme erro cometido. Claro que é grandíssimo o esforço. Evidente que o simples facto de respirar pode ser penoso. Mas também por isso é enorme o privilégio de tal proximidade testemunhar. Os limites humanos nunca são tão baixos como os julgamos. Mesmo as nossas barrigas burguesas se adaptam a ementas inenarráveis. A nossa pele envereda pelo caminho oposto ao dos nossos ancestrais que partiram venturosamente do velho continente. Transformamo-nos em híbridos com um pé no auto-denominado primeiro mundo enquanto o outro aprende caminhos olvidados. A dias de desespero, períodos de auto-conhecimento, de superação intelectual, sobressaem. Novos amigos apresentam desafios a explorar. Formas de viver ignoradas e estranhas vulgarizam-se. Aprendemos que há muito mais pontos de vista. Raciocínios teoricamente abstrusos perfilam-se como perfeitamente válidos. Valorizamos o raro, o difícil de obter. Subitamente apercebemo-nos que aqui isso pode ser uma flor.

sábado, 3 de outubro de 2009

Fim à vista!(?)

3 de Outubro de 2009, Sábado. Há dois anos estava de partida para Kaédi, onde ia substituir o Rodrigo que ia de férias a Portugal. Nessa altura, a obra estava para começar. Agora, a realidade é outra completamente diferente. Não voltarei a Kaédi, para substituir o Rodrigo… A obra está já longe do seu início, se bem que o final ainda não esteja à vista,  especialmente em Kaédi. Aqui em Selibaby, talvez mais seis meses sejam suficientes. De então para cá muita coisa mudou. O que ficou bem patente neste entretanto foi a falta de preparação. Chega a ser confrangedor como não se preparou esta obra. Claro que quem está no terreno é que sofre na pele. O pessoal que a bem ou a mal vai terminar isto, na maioria das situações tem que fazer uso do famoso desenrascanço dos portugueses. Claro que isto tem um custo. Só espero que no final os responsáveis por este trabalho em cima do joelho dêem a cara e não queiram passar a batata quente por quem já amargou aqui com dois anos de sol, pó, calor imenso, cantina desgraçada, querer trabalhar e não poder…

DSCN4336

A ponte de Garfa já está pronta!

Tem os que passam

Tem os que passam, de Alice Ruiz "Tem os que passam e tudo se passa com passos já passados tem os que partem da pedra ao vidro deixam t...