O abismo fascinou os homens
desde que começaram a caminhar erectos. Se conseguiram contrariar a natureza e
ser bípedes, viver sempre num equilíbrio instável, porque não desafiar a Mãe em
todas as actividades? Nesta era antropocénica em que vivemos, quase
completamente desligados do meio ambiente, em que celebramos a vitória
hominídea incondicional sobre o pequeno calhau a que chamamos terra, o ambiente
está como a economia, depois dos avanços incríveis até ao final dos anos
oitenta, entrámos aos solavancos pela beira do abismo e hoje ninguém sabe o que
se vai passar amanhã, acabaram as garantias, as certezas, a estabilidade.
Afinal a doença da Terra, hoje
atinge milhões de pessoas que habitam em locais mais sensíveis, amanhã deverá
atingir muitos mais, se hoje atinge especialmente zonas desfavorecidas, amanhã
chegará às zonas mais desenvolvidas, se hoje atinge especialmente zonas
tropicais, amanhã poderá corromper as grandes metrópoles ocidentais.
A juntar à situação
ambiental, com as suas alterações climáticas, vem a instabilidade política
auto-infligida numa UE que olha apenas para os seus pequenos umbigos nacionais,
esquecendo os ideais que levaram à sua criação; a instabilidade política do
médio oriente, que não se antevê ter fim próximo, juntando à guerra
inter-religiosa em curso desde há séculos, nova guerra fratricida
intra-religiosa entre as várias facções de seguidores do profeta árabe. África
continua adiada, sem cumprir seu ideal, como diria o poeta, deixando cada vez
mais cidadãos sem esperança. Os pólos a derreter, cada dia mais rápido. Extinção
em massa que atinge cada vez mais espécies.
Estes diagnósticos que já
todos conhecem, começaram a ser apresentados por ambientalistas “fanáticos” há quatro
décadas, hoje a imprensa “mainstream”
divulga com naturalidade. O que mudou? Infelizmente muito pouco, falamos disto
como falamos do preço da sardinha ou dos fogos no verão. Algo inevitável. Fatalista.
É o destino.
Provavelmente será mesmo o
destino, não por estar escrito, mas sim por ser este destino que estamos a
escrever todos os dias.
Tanta dissertação e no
entanto “Eppur si muove” a população
do concelho de Torres Novas não conseguindo suportar mais a incúria, o
desleixo, o compadrio, a vergonha (e acima de tudo o mau cheiro) das
autoridades locais, regionais e nacionais, a propósito da ribeira da Boa Água
(curioso nome tem este pequeno curso de água que tão maltratado tem sido nos últimos
tempos), começou a manifestar-se. Talvez tenha sido atingido o ponto em que o
copo transbordou e não haja mais passividade para permitir o abuso continuado
de um bem público, que é o ar que respiramos, pelo menos nos termos deploráveis
utilizados por empresários sem escrúpulos, políticos sem vergonha, serviços sem
meios, população amolecida pelos “Big
Brothers” anos a fio…
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