Mais uma vez de volta a terras de Malanje, desta vez
finalmente para desfrutar. Após Cacuso encontrámo-nos numa recta que se
estendia para lá do horizonte, bem, recta mais ou menos, pois em determinado
ponto existe uma chicane, mas o piso
é óptimo e o traçado também. O dia estava fresco, nebuloso, a ameaçar chuva. Ao
cruzar o rio Lucala deparámos com uma ponte testemunha dos tempos atribulados
porque esta terra passou, metade em betão, antiga e metade metálica, da
engenharia militar. Subimos ao planalto e entrámos em Kalandula, via dupla com
duas faixas em cada sentido, separador ao centro, casas relativamente cuidadas,
da época colonial, seguimos para os derradeiros 4 km. Finalmente as quedas. São
tudo aquilo que ouvira dizer. Maravilha da natureza. As fotos da praxe, e fica
um gosto estranho na boca, fizemos 250 km “apenas” para ver um bolo de
chocolate atrás de uma montra? Pode ser belo, mas falta-lhe o aroma e o gosto.
O Domingos e o Mateus convenceram-nos a baixar à base da cascata. O início da íngreme
descida mostrou-nos logo o que iríamos encontrar, muito verde, um ar de selva
luxuriante, flores únicas, chilrear de pássaros desconhecidos e uma vista de
cortar a respiração. Já nas margens do Lucala reparámos que havia que passar
zonas bastante enlameadas, outras seria mesmo a vau, noutras ainda o mato era
tão denso que nem se via o caminho. Finalmente chegámos ao destino. Visão
fantástica. Um sorriso inundou a todos. Foi para isto que viemos. O vento
resolveu então pregar-nos uma partida, pegou na água em queda livre, elevou-a e
direccionou-a para nós. Num dia calmo, quente, com o sol a aparecer, vimo-nos
completamente ensopados. Não nos levou a boa disposição contudo. O regresso
fez-se por caminho, agora já conhecido, até ao distante topo do planalto, mais
de 100 metros. Se a descida é rápida e tranquila, apenas requer cuidado para
não ter uma queda, a subida exige fôlego. De volta ao topo e ao calor do verão
africano, todos mais ricos, cansados, sujos e molhados, mas também felizes e
esfomeados. O almoço foi uma deliciosa surpresa. Um belo cacusso grelhado, num
restaurante aprovado pelo painel.
Estes escritos representam acima de tudo estados de espirito. Dia a dia de um português em Portugal
terça-feira, 23 de dezembro de 2014
domingo, 14 de dezembro de 2014
Balanço
Assim em jeito de balanço, que o
2014 já vai para desconto de tempo, vejo que o mundo ficou muito perigoso.
Fundamentalismos avançam por toda a parte. Agendas escondidas governam grande
parte dos países. Intolerâncias germinam. Polícias brancos matam negros nos
EEUU diariamente. Desemprego. Desengano. Miséria. Milhares arriscam travessias
suicidas em barcos apinhados, que afundam afogando sonhos. A Europa rica
assobia para o ar, riscando do vocabulário palavras tão simples como: solidariedade,
apoio, redistribuição, expectativas; numa sucessão de asneiras, que dariam
vontade de rir não fora os efeitos devastadores em milhões de novos pobres. O
mundo está a ficar perigoso. O novo passatempo dos meninos mimados europeus, é
ir para a guerra no médio oriente, e postar filmes e fotos de decapitações e
outras selvajarias inimagináveis no século XXI, vontade que subitamente pára
quando o Iphone quebra e ficam sem conseguir estar nas redes sociais, nessa
altura pedem ajuda aos papás para regressar aos países de acolhimento e voltar
a usufruir do conforto burguês decadente…
África vai vendo o tempo passar e
continua sem conseguir distribuir a riqueza que vai extraindo do subsolo pelas
suas gentes, num ciclo de pobreza autofágico sem fim. As alterações climáticas
começam a fazer-se sentir um pouco por todo o lado, num planeta sobrelotado em
que algumas colheitas consecutivas falhadas podem ter efeitos devastadores. O
planeta está vivo e começa a criar anticorpos para expurgar os parasitas que o
violam incessantemente sem réstia alguma de respeito. Todos os sistemas
caóticos tendem para o equilíbrio, pode demorar algum tempo, mas as leis da
natureza também nos regem, por mais que tentemos olvidar.
Em termos pessoais o ano ficou
marcado por um início absolutamente devastador, fruto de um acidente estúpido,
que alterou as nossas vidas para sempre. Hoje somos outros, felizmente que nos
momentos maus há alguém que diz presente, mesmo se tantos se vão. Há uma
lágrima no canto do olho, permanente. Uma tristeza que tolda o olhar. Há sempre
um som que nos faz recordar, uma loja que era os teus olhos, é certo que também
há os novos amigos que nos fazem sentir bem, os teus amigos que nos abraçam,
que nos dizem que devemos estar orgulhosos da filha que criámos. E os rios de
lágrimas que descem em torrentes destes olhos que começam a ficar cansados…
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